O poema das mãos soluçantes, que se erguem num desejo e numa súplica
Como são belas as tuas mãos, como são belas as tuas mãos pálidas como uma canção em surdina... As tuas mãos dançam a dança incerta do desejo, e afagam, e beijam e apertam... As tuas mãos procuram no alto a lâmpada invisível, a lâmpada que nunca será tocada... As tuas mãos procuram no alto a flor silenciosa, a flor que nunca será colhida... Como é bela a volúpia inútil de teus dedos... O poema das mãos que não terão outras mãos numa tarde fria de Junho Pobres das mãos viúvas, mãos compridas e desoladas, que procuram em vão, desejam em vão... Há em torno a elas a tristeza infinita de qualquer coisa que se perdeu para sempre... E as mãos viúvas se encarquilham, trêmulas, cheias de rugas, vazias de outras mãos... E as mãos viúvas tateiam, insones, − as friorentas mãos viúvas... O poema dos olhos que adormeceram vendo a beleza da terra Tudo eles viram, viram as águas quietas e suaves, as águas inquietas e sombrias... E viram a alma das paisagens sob o outono, o voo dos pássaros vadios, e os crepúsculos sanguejantes... E viram toda a beleza da terra, esparsa nas flores e nas nuvens, nos recantos de sombra e no dorso voluptuoso das colinas... E a beleza da terra se fechou sobre eles e adormeceram vendo a beleza da terra...
Carlos Drummond de Andrade
Enviado por Tonia Aleixo em 28/11/2015
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